sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Hollow

As vezes passava o dia sem falar com ninguém. Guardava para si seus pensamentos, o que causava um tumulto em sua cabeça. As palavras não emitidas brigavam entre si, buscando a supremacia e ascensão na enorme fila que se formava para sair.
Fora de sua mente, o mundo passava. E nada ele falava. Não que se tratasse de um tímido, tampouco era uma pessoa sem opinião. Muito pelo contrário, o que ele mais tinha era ideias sobre o mundo ao redor. Sobre a catraca do ônibus. Sobre a música do Badfinger. Sobre a forma de gelo que ninguém nunca enche. Sobre a política externa do Cazaquistão. Mas todas elas eram presas por seus dentes, e por mais que sua língua tentasse expressá-los eles morriam ainda em suas entranhas.
Talvez não fosse o melhor jeito de viver; toda a complexidade humana, ainda que artificial, produzida por reações de elementos químicos e impulsos elétricos que se fazem acreditar por coisas sérias, não foi feita para ser aprisionada. A linguagem provavelmente se desenvolvera por isso: para que os demônios internos de cada pessoa pudessem ser exorcizados de forma simples. A inexpressão nos força a enfrentar o pior dos inimigos em batalha, o eu mais verdadeiro e inatingível. Essa luta desmonta por dentro, revolvendo até a parte mais profunda do que nos faz humanos. Pois sim, o verdadeiro sentido de humanidade só é atingido após nos expressarmos, após purgar a alma de seus demônios e renascer em sentido, ideia e espírito.
Agora, mais ideias se formavam sem sair de dentro dele. Uma das possíveis razões era a falta de platéia. De que vale dizer o que não haverá ninguém para ouvir? Ainda que mais pessoas estivessem em volta, não necessariamente elas estariam ali para ouvir algo. Ainda que estivesse conversando com alguém, nada indica que ele seria ouvido. Diz-se também que a comunicação só termina na mente do receptor, com ele completando o que foi emitido com sua própria bagagem e visões. Então de que vale emitir ideias que permanecerão incompletas? De enviar mensagens trôpegas, ocas e perdidas?
Mas não era essa a razão.
A razão, pura e simplesmente, era porque ele tinha medo. Apenas assim.