quinta-feira, 30 de junho de 2011

Decisão


Acordei decidido.
Hoje vou enlouquecer.
Se nada mais faz sentido
Porque eu vou fazer?

Enxergo tudo de ponta cabeça
Ou invertido como num espelho
O que me leva para a direita
No mínimo é amigo do ceifeiro

Chamam-me de esquisito
E olha que nem havia ainda enlouquecido
Só por causa de meus versos
Não falarem do infinito

Ou de minhas ideias não falarem
Aquilo que estão acostumados a pensar
Ou de não gostarem
Do que tenho a declarar

Mas tudo bem, sem mágoas eu vivo
Um palhaço triste num teatro vazio
E agora vou sentir um grande alívio
Pois ser louco me dará grandes risos

Acho que devo ir agora
Ficar louco, sem demora
Abraçar o insano e dançar
E um de vocês vou me tornar

Obrigado a todos pelos aplausos
Cortinas se fecham, saio do palco
Agora meu lugar é com vocês
Nesse mundo sombrio, viverei outra vez.

The Darkest Night



A solidão pura e simples
A traição, o abandono, o definhar
A saudade de tempos passados
O medo pelo futuro

Hoje você diz que se preocupa comigo
Mas e quando eu me preocupei com você
E quando todos esses que me chamam de pária
Chamaram você de exilado?

E agora nada tenho
Nada além de dúvidas dolorosas
De formas abstratas e horríveis que dançam na minha frente
Negadas por você, que continua olhando apenas para você

O vazio me encobre e me traz lembranças
De algo que se perdeu completamente
Um tempo em que éramos fortes
Um tempo onde nos defenderíamos
 
E agora apenas o vazio
Preocupe-se comigo se quiser
Agora se foi
Agora não há mais

Mas devo agradecer eu acho
Não pela dor, não pela saudade
Não pelas lições, não pela falta
Mas por ter me ensinado que tudo, sem exceção, acaba.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Caminhava

Caminhava. Não andava vulgarmente, caminhava aproveitando todas as nuances que a noite lhe oferecia. A luz amarelada da iluminação pública realçava cada detalhe, cada ponto escuro que tentava esconder-se em meio a sombras. Observava e tentava compreender aquilo tudo. Absorver os contrastes, as penumbras, as idéias de mais uma noite que caía pelo mundo. Não havia espaço para pensar em sua vida, nas coisas que deixara em casa, na vigência do universo na existência humana. Apenas o negro, com todos os seus conteúdos e formas.
De repente, um estalo. Não foi algo que aconteceu, ou alguém que apareceu. Um pensamento que surgiu de forma espontânea, natural, sem qualquer razão ou propósito. Alguns chamariam de epifania, uns de insight, outros apenas admitiriam a existência dele. Chegou abrindo portas, liberando memórias, cheiros e significados. Trouxe razões à mostra, pessoas a sua presença, verdades derrubadas, mentiras sustentadas, com tanta força que não havia como detê-lo. Uma represa aberta inundou sua mente, varrendo e transformando o que quer que fosse tocado por suas águas. Um novo ser surgia dessas águas, abrindo seu caminho com braçadas largas e força épica. Vales destruídos, casas demolidas, montanhas derrubadas, e ele só. Imagens oníricas dançando, levantando novas razões de ser, e fortalecendo o recém-nascido, nutrindo-o e instruindo-o sobre o que esperar. Novos desafios, obstáculos a transpor e uma vitória apenas condicional à sua própria vontade.
Então, tão rápido quanto surgiu, ele sumiu. O tema poderoso do qual ele se originou voltou para seu lugar nas sombras, trancando novamente o que foi libertado. O choque havia sido tão poderoso que ele havia sido obrigado a apoiar-se num portão que estava por perto. De nada mais recordava, não sobrara um vislumbre do que havia sido isso, nem como libera-lo novamente.
Recompôs-se, acendeu um cigarro e prosseguiu. Não havia mais nada a procurar na noite, não importando a direção do olhar. Prédios com luzes acesas, casas apagadas, calçadas mal iluminadas, e só. Mas uma semente havia sido plantada aquela noite. Não era capaz de dizer o que era, nem se interessava naquele novo sentimento de ser. Foi uno com algo imaterialmente imenso, mas agora era apenas ele mesmo.
Quem vislumbra o todo jamais fixa seu olhar em um ponto novamente, eis a lição deixada.
Riu de suas pretensões filosóficas, acendeu outro cigarro e preparou-se para o amanhã.

terça-feira, 28 de junho de 2011

O que você quer da sua vida?


Respostas sem sentido voam em um turbilhão. Nunca havia pensando sequer na possibilidade de estar vivo hoje, quanto mais no que ele gostaria para o resto de sua vida [algo que assim como todas as dimensões maiores que o comprimento de seus braços, um ser humano é incapaz de entender].  Havia pensado em ser astronauta ou jogador de futebol quando pequeno, quando adolescente um executivo bem sucedido, quando adulto um profissional respeitado na área que se formou e mais tarde qualquer coisa com dinheiro. Aceitava até se um bundão notório, desde que rico.
Então, passados mais de três décadas vivendo mais por consequência do que por escolha, surge essa questão. “Oras, se eu pudesse ter escolhido já teria escolhido, mas me tiraram esse direito, tive que trabalhar, então o leque foi se fechando e quando vi estava aqui, grudado numa mesa, mexendo num computador vulgar e exercendo minha digna função de número corporativo” pensa ele. Olha fundo nos olhos de seu interlocutor, procurando coragem para falar isso, sem qualquer alteração. Respira fundo.
- Eu gostaria de continuar crescendo nessa empresa, e me tornar um gerente de seção ou algo assim.
- Mesmo? Olha, eu estava olhando seu trabalho, e se você não faz com muita má vontade, você é completamente incompetente.
Bang. Sabia que não havia como sair algo bom de seu trabalho mesmo, por um misto extremamente peculiar de tendências anticapitalistas e frustração por ser um bundão notório, mas pobre.
- O senhor me julga mal – balbucia, mas é interrompido.
- Não me leve a mal. Estou aqui para orientar funcionários a encontrar melhores lugares na organização. Vi que você se formou em sociologia, mas está atuando num setor financeiro. A questão é: por quê?
- Eu quis entender o sistema antes de ganhar dinheiro nele.
- E funcionou?
- Estava indo bem até você aparecer – disse isso com uma convicção tão fraca que se a frase fosse “Você é um peixe” dita para um atum, teria causado uma crise de identidade no dito cujo.
- Não, não estava. Senão eu não estava aqui conversando com você. Vejamos o que podemos fazer... Posso inscrever você num curso da área, tentar transferi-lo para um setor que mais lhe agrade ou recomendar um novo emprego. O que você prefere?
- Nenhum delas. Quero terminar essa conversa e voltar para o meu trabalho – Surpreendeu-se dizendo. Esperara uma saída por tanto tempo, e agora que chegara ele estava recusando?
- Que você faz igual a sua bunda. Vamos escolha uma.
Pensou. O que aquele cara sabia afinal? Como ele dizia que o trabalho dele era ruim? Ele já viu sua bunda? Talvez no banheiro, embora ele não saiba precisar o dia. Talvez tenha sido quarta. E ele não gostou da sua bunda? Ou foi um elogio velado?
- Sabe, muito obrigado pela sua preocupação. Sério, muito obrigado mesmo. Mas se já acabou tenho um monte de trabalho pra fazer – A tensão dominava seu corpo. Queria gritar pra que o seu emprego fosse tomado, deixando-o sem alternativa. Na rua da amargura, aonde ele poderia recomeçar como um hippie vendendo miçangas e tomando toda sorte de chá alucinógeno. Quase podia sentir o gosto do chá de fita que fizera há tantos anos atrás...
- Tem certeza? Essa é a chance de você voltar a se realizar profissionalmente. Quem sabe até ganhar mais. Mas isso tem que partir de você.
Olhou nos olhos do entrevistador novamente. Tinha um grito de “Viva a igualdade entre as comunidades naturistas do baixo Parnaíba!!” preso na garganta. Estudou por um instante a possibilidade de chutar o que havia em cima da mesa, soltar um urro irracional e correr pra longe dali. Ia ser diferente, dessa vez tudo ia mudar. É a chance que ele esperara a vida toda. 1, 2 e...
- Decidiu?
Foi por um triz. Aquela frase tirou-o da espiral em que tinha mergulhado sua consciência. Afinal de contas, era muito tarde, e muito pouco.
- Obrigado. Vou voltar pro meu trabalho.
Foi com um sentimento de vitória. Aquele maldito funcionário do sistema injusto não havia conseguido controlar sua vida. Agora ele estava na merda, mas sem caridade ou ajuda de ninguém. Um bundão notório, apenas por seus próprios esforços. Pela primeira vez desde que se empregara ali, fez seu trabalho feliz.



O entrevistador voltou para sua casa mais cedo aquele dia. Não estava surpreso com o fracasso com o caso do dia. Sabia que ele seria demitido daqui a umas duas semanas não importa para qual setor fosse. Nada pior que um idiota frustrado numa empresa de vencedores. A vida é para os fortes, quem fica para trás não merece consideração. Ao chegar em casa, surpreendeu seu marido com outro na cama, deu um escândalo, largou tudo e hoje vende miçangas numa estrada do interior.

Raiva nº1


Em como se punir por algo que não se fez
Em chegar à conclusão que se errou e não sentir arrependimento algum
Em ser tão bisonhamente conformado que se esquece do ódio
Em não ter mais espaço para lágrimas nos olhos
Em estar se afogando e recusar a bóia oferecida
Em não ter mais medo da porta que insiste em acertar seu rosto
Em morrer cada dia um pouco, mas não sentir mais dor
Em usar de eufemismos para descrever catástrofes épicas
Em estar cansado da caminhada a ponto de desistir a dois passos do objetivo
Em correr sem parar apenas para cair com grande frequência
Em ter seu destino esfregado na sua cara a cada frase dita por outros
Em ler sua sorte no obituário

Ou fugir de um barco em chamas
Ou escapar de um porão trancado
Ou esgueirar-se sob a mira de holofotes
Ou andar devagar numa estrada
Ou caminhar pelos trilhos de um trem, torcendo para que ele o encontre
Ou reconhecer sua mãe no prostíbulo
Ou passar raiva apenas por 10 minutos
Ou procurar sentido em ter de ser a si mesmo
Ou estar triste como pessoas podem ser
Ou conformar-se com o roubo de um peixe do aquário
Ou querer o que já é querido
Ou perder o que nunca foi seu

Como fome depois da sede
Como chuva após bombardeios
Como esquisitices mil
Como debater-se num avião que cai
Como fugir de si mesmo apenas para se ver na próxima esquina
Como placidez após pânico
Como resignação total e irrestrita
Como estagnação perene e cretina
Como usar uma bazuca para matar baratas
Como estranho ser em existir
Como negação de forma de vida
Como não aprender com erros, nem de outros nem próprios


Talvez um escriba cego com uma pena de morte
Talvez o tédio mortal e galopante
Talvez a raiva por sofrer sem sequer ter pedido para existir
Talvez inconstante e nunca visto na mesma forma
Talvez enjoativo como olhar para baixo do 55º andar
Talvez tão escroto quanto abominável
Talvez tão desprovido de sentido que seja inócuo
Talvez tão insincero quanto você
Talvez tão etéreo quanto mármore
Talvez insípido, ou ríspido
Talvez faltante
Talvez medonho e bizarro

Nunca presente.

Boas vindas a quem será bem vindo.

Olá a todos!

Pretendo utilizar esse blog para minha satisfação pessoal e intransferível. Mas peço que acompanhem meus textos, se possível comentando e opinando. Tentarei atualizar diariamente, mas desde já não prometo nada.


A inspiração aparece quando quer, e como não tenho nenhum objetivo senão postar textos de minha lavra, serei um eterno dependente dela. Muito obrigado e fique à vontade.